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Eventos Adversos e Disclosure: Transparência na Assistência à Saúde

Os eventos adversos (EAs) na área da saúde representam um grande desafio para a segurança do paciente e para a gestão hospitalar. A transparência na comunicação desses eventos, por meio do processo de disclosure, tem sido cada vez mais incentivada para promover uma assistência mais segura e ética. É discutido a definição, impacto e estratégias de mitigação dos EAs, além da importância do disclosure na relação entre profissionais de saúde, pacientes e instituições.

Imagem ilustrativa gerada por IA de evento adverso.
Imagem ilustrativa gerada por IA de evento adverso.

Os eventos adversos (EAs) representam um dos principais desafios da segurança do paciente e da qualidade assistencial na área da saúde. São definidos como incidentes que resultam em dano não intencional ao paciente, sendo muitas vezes preveníveis por meio de práticas de gestão de risco e protocolos clínicos mais rigorosos. A ocorrência de EAs pode comprometer a confiança na relação entre profissionais de saúde e pacientes, além de gerar repercussões éticas e legais para as instituições.

Nesse contexto, o processo de disclosure, que se refere à comunicação transparente sobre eventos adversos, tem ganhado espaço como uma prática essencial para garantir a confiança e a ética na assistência. Estudos apontam que a adoção do disclosure melhora a relação entre pacientes e profissionais, reduz a judicialização da saúde e contribui para o aprimoramento dos processos de segurança (LEAPE et al., 1991; VINCENT et al., 2001).


Definição e Classificação dos Eventos Adversos

Os eventos adversos são incidentes que causam danos ao paciente como resultado direto da assistência prestada, e não da condição clínica subjacente (LEAPE et al., 1991). Eles podem ser classificados em:

  • Eventos evitáveis: Podem ser prevenidos com medidas adequadas de segurança e protocolos clínicos eficientes.

  • Eventos inevitáveis: Resultam de complicações inerentes à condição clínica do paciente, mesmo com uma assistência apropriada.

  • Eventos sentinela: Incidentes graves que resultam em morte, danos permanentes ou grande prejuízo ao paciente.


Epidemiologia e Impacto

Estudos apontam que a incidência de eventos adversos varia entre 4% e 17% das internações hospitalares (VINCENT et al., 2001). Além das implicações diretas para o paciente, esses eventos resultam em:

  • Aumento do tempo de internação;

  • Custos hospitalares elevados;

  • Maior risco de litígios e processos judiciais;

  • Impacto psicológico nos profissionais envolvidos;

  • Redução da confiança dos pacientes no sistema de saúde.


Definição e Princípios do Disclosure

O disclosure consiste na comunicação transparente sobre eventos adversos, permitindo que os pacientes sejam informados sobre o que ocorreu, quais medidas corretivas serão adotadas e como evitar que o problema se repita. Seus princípios incluem:

  • Comunicação clara e objetiva;

  • Expressão de empatia e responsabilidade;

  • Explicação das medidas corretivas e preventivas;

  • Acompanhamento contínuo do paciente e familiares.



Benefícios do Disclosure

Pesquisas indicam que a adoção do disclosure reduz processos judiciais, melhora a satisfação dos pacientes e contribui para um ambiente de maior confiança (WU et al., 1997). Além disso, promove a cultura de segurança dentro das instituições, tornando-as mais resilientes a falhas e incidentes adversos.

Desafios e Barreiras na Implementação

Apesar de seus benefícios, o disclosure enfrenta desafios significativos, como:

  • Medo de repercussões legais e institucionais;

  • Falta de preparo dos profissionais para comunicar eventos adversos;

  • Cultura punitiva nas organizações de saúde;

  • Resistência por parte da equipe assistencial em admitir erros.



Diretrizes Éticas

O Código de Ética Médica (CFM, 2018) recomenda a comunicação honesta sobre erros médicos. Normativas internacionais, como as diretrizes do Institute for Healthcare Improvement (IHI), reforçam a importância do disclosure como ferramenta essencial para a melhoria da qualidade assistencial.

Do ponto de vista legal, países como os EUA e o Canadá possuem regulamentações específicas que incentivam a comunicação aberta de eventos adversos (KACHALIA & STUDDERT, 2004). No Brasil, o direito à informação está previsto no Código de Defesa do Consumidor e na Resolução CFM n.º 2.217/2018.



Implementação do Disclosure

Para garantir que o disclosure seja eficaz, as instituições de saúde devem adotar medidas como:

  • Treinamento de profissionais: Capacitação contínua em comunicação empática, habilidades de mediação de conflitos e gestão de crises.

  • Desenvolvimento de políticas institucionais: Elaboração de diretrizes e fluxos operacionais claros para o disclosure.

  • Apoio aos profissionais envolvidos: Disponibilização de suporte psicológico, jurídico e administrativo aos profissionais de saúde.

  • Monitoramento e avaliação contínua: Implantação de indicadores de qualidade para medir o impacto do disclosure na segurança do paciente.

  • Criação de um ambiente livre de retaliação: Implementação de uma cultura de aprendizado com foco na melhoria contínua, ao invés da punição.

  • Uso de tecnologia: Sistemas eletrônicos de registro de eventos adversos para garantir rastreabilidade e análise aprofundada dos casos.


O disclosure representa um avanço na segurança do paciente ao promover a transparência e a confiança na relação entre profissionais de saúde e pacientes. A adoção dessa prática não apenas melhora a qualidade da assistência prestada, mas também contribui para a redução da judicialização na saúde e o fortalecimento da cultura de segurança. Para que sua implementação seja bem-sucedida, é necessário um compromisso institucional e uma mudança cultural dentro dos serviços de saúde.


Referências

  • LEAPE, L. L. et al. The Nature of Adverse Events in Hospitalized Patients. New England Journal of Medicine, v. 324, n. 6, p. 377-384, 1991.

  • VINCENT, C. et al. Adverse events in British hospitals: preliminary retrospective record review. BMJ, v. 322, p. 517-519, 2001.

  • WU, A. W. et al. Do House Officers Learn from Their Mistakes? JAMA, v. 277, n. 12, p. 1039-1044, 1997.

  • KACHALIA, A.; STUDDERT, D. M. Disclosing medical errors: the view from the USA. Surgery (Oxford), v. 22, n. 5, p. 322-326, 2004.

  • CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA (CFM). Código de Ética Médica. Resolução CFM n.º 2.217/2018, Brasília, 2018.

  • INSTITUTE FOR HEALTHCARE IMPROVEMENT (IHI). Communicating with Patients about Adverse Events. 2020.

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